I Ching, o Livro das Mutações - Livro Primeiro, Hexagrama 48: Ching / O Poço
Esse texto faz parte da série a respeito do I Ching, o Livro das Mutações, que publicamos no blog quinzenalmente. A proposta é apresentar os textos sobre os 64 hexagramas publicados nos livros Primeiro e Terceiro do livro de Richard Wilhelm.
Para entender melhor o que é o I Ching, sugerimos dar uma olhada no post:
Para consultar o índice dos 64 hexagramas, basta acessar:
Cada hexagrama inclui:
- uma introdução geral, apresentando aspectos básicos do hexagrama;
- o nome do hexagrama (卦名 guàmíng), que por si só já é repleto de simbolismos;
- o texto, também chamado julgamento ou oráculo, que revela em linguagem simbólica o significado do hexagrama e possui poucas frases, tendo a ele sido adicionados comentários e interpretações ao longo dos séculos, a fim de ajudar o leitor a traduzir o ensinamento ancestral;
- a imagem ou símbolo, que apresenta uma mensagem adicional, com um modelo de conduta ou um conselho estratégico para lidar com a situação indicada pelo hexagrama; e
- os textos das linhas, em número de seis, indicam alternativas ou transformações possíveis das condições retratadas no hexagrama - lembrando que as linhas são contadas de baixo para cima, sendo a linha inferior a primeira.
E isso é basicamente tudo que você precisa saber para continuar. Boa leitura!
Livro Primeiro (o Texto), Hexagrama 48: Ching / O Poço
A madeira está abaixo, a água, acima. A madeira desce ao interior da terra para extrair a água. Esta imagem refere-se a um tipo de poço utilizado na China antiga, que usava o sistema de eixo e balde.
A madeira não representa os baldes, que na antiguidade eram feitos de barro, mas os eixos com os quais se retirava a água do poço. A imagem faz também alusão ao mundo vegetal que, por meio de suas fibras, extrai a água da terra.
O poço do qual se retira a água sugere, também, a ideia de uma inesgotável dádiva de alimento.
Julgamento
O POÇO. Pode-se mudar uma cidade, mas não se pode mudar um poço. Este não diminui nem aumenta. Eles vão e vêm, recolhendo do poço. Quando se chega próximo ao nível da água, mas a corda não vai até o fundo ou o balde se quebra, isso traz infortúnio.Na China antiga mudava-se, às vezes, a capital, ora buscando-se melhor localização, ora em virtude da mudança das dinastias.
O estilo arquitetônico modificou-se no decorrer dos séculos, mas a forma do poço permaneceu a mesma, desde os tempos mais remotos até a atualidade.
Assim, o poço é o símbolo daquela estrutura social que a humanidade desenvolveu de modo a atender às suas necessidades primordiais e que independe de todas as formas políticas.
As estruturas políticas mudam, assim como as nações, mas a vida humana em suas necessidades permanece idêntica. Isto não se pode mudar.
A vida é também inesgotável. Não diminui nem aumenta, e existe para todos.
Há, porém, dois pré-requisitos necessários a uma satisfatória organização social ou política da humanidade. É preciso ir aos fundamentos da vida.
A mera ordenação superficial da vida, que deixa insatisfeitas as necessidades mais profundas e vitais, é, na verdade, inútil. É o mesmo que não realizar qualquer esforço de organização.
A negligência - em virtude da qual o cântaro se quebra - é também desastrosa.
Se, por exemplo, a defesa militar de um estado for levada a excessos, vindo a provocar guerras que aniquilem o poder da nação, isso seria correspondente à quebra do cântaro.
Esse hexagrama também se aplica ao indivíduo. Apesar das diferenças em tendências e educação, os fundamentos da natureza humana são idênticos em todos os seres.
E cada indivíduo, em sua formação, pode usufruir dessa fonte inesgotável que é a centelha divina presente no interior da natureza humana. Mas aqui também dois perigos ameaçam.
Primeiro, o risco de, em sua educação, o homem não chegar às verdadeiras raízes da condição humana, ficando preso às convenções - uma formação parcial como esta é tão nociva quanto nenhuma formação.
Ou, em segundo lugar, ele pode sofrer um súbito colapso em sua educação, desistindo do autodesenvolvimento.
Imagem
Água sobre a madeira: a imagem do POÇO. Assim o homem superior incentiva o povo em seu trabalho, exortando as pessoas a se ajudarem mutuamente.
O trigrama Sun, madeira, está abaixo; o trigrama K'an, água, está acima. A madeira traz a água para o alto.
Em sua vida orgânica, a madeira reproduz o funcionamento do poço. Nessa atividade, todas as partes da planta são beneficiadas.
Assim também, o homem superior organiza a sociedade humana de modo a que, tal como na estrutura orgânica das plantas, as partes cooperem para o benefício do todo.
Textos das linhas
Seis na primeira posição significa: não se bebe no barro do poço. Nenhum animal vem a um poço velho.
Quando alguém vaga por uma região de depressões pantanosas, sua vida submerge no lodo. Tal pessoa perde todo significado para a humanidade.
Aquele que assim se põe a perder não é mais procurado pelos outros. Ao final, ninguém mais se importa com ele.
Nove na segunda posição significa: atirar-se nos peixes à entrada do poço. A cântaro está quebrado e vazando.
A água é limpa, mas não está sendo utilizada. Assim, só os peixes vivem no poço, e quem dele se aproxima o faz apenas para pescar.
Mas o cântaro está quebrado e não se pode manter os peixes nele. Isso descreve a situação de alguém que tem boas qualidades, mas as negligencia. Ninguém se preocupa com ele.
Como consequência, ele se corrompe interiormente. Associa-se a homens inferiores e já não pode mais realizar nada de valor.
Nove na terceira posição significa: o poço foi limpo, mas não se bebe dele. Este é o pesar de meu coração, pois se poderia usufruir dele. Caso o rei fosse lúcido, se poderia compartilhar a boa fortuna.
Existe aqui um homem capaz. Ele é semelhante a um poço que foi limpo e de cujas águas se pode beber.
No entanto, não está sendo utilizado. Essa é a tristeza daqueles que o conhecem. Seria desejável que o príncipe fosse posto a par do que ocorre, pois isso traria boa fortuna a todos.
Seis na quarta posição significa: o poço está sendo revestido. Nenhuma culpa.
Não se pode utilizar um poço enquanto ele está sendo revestido. Este trabalho, no entanto, não é em vão; graças a ele, a água permanece límpida.
Na vida também há períodos em que o homem precisa se reorganizar. Durante este tempo, ele não pode fazer nada pelos outros.
Mesmo assim, seu trabalho é valioso. Desenvolvendo suas forças e habilidades através do aprimoramento interno, ele poderá realizar muito mais no futuro.
Nove na quinta posição significa: no poço há uma nascente límpida e fresca da qual se pode beber.
Um poço em cujo interior há uma fonte que verte a água da vida é, sem dúvida, um bom poço. Um homem que tenha virtudes semelhantes nasceu para ser salvador e líder da humanidade.
Ele possui a água da vida. No entanto, o presságio "boa fortuna" é aqui omitido.
O decisivo em relação a um poço é que sua água seja retirada. A melhor água permanece sendo apenas uma possibilidade de alívio para os seres humanos enquanto não for retirada.
O mesmo ocorre em relação aos líderes da humanidade; o importante é que se beba de sua fonte e que suas palavras sejam aplicadas à vida.
Seis na sexta posição significa: retira-se água do poço sem impedimentos. Pode-se confiar nele. Suprema boa fortuna!
O poço existe para todos. A ninguém é proibido retirar água.
Não importa quantos venham, todos encontram o que necessitam, pois se pode confiar no poço. Nele há uma fonte que nunca seca. Por isso, o poço representa uma grande boa fortuna para todo o país.
O mesmo ocorre com o homem verdadeiramente grande, em sua inesgotável riqueza interior; quanto mais as pessoas vêm buscá-la, tanto mais ela se engrandece.
Depois de tudo
E aqui alcançamos o final do texto sobre o hexagrama Ching / O Poço, da primeira parte do livro I Ching, o Livro das Mutações.Caso tenha interesse, pode adquirir o livro clicando na imagem a seguir:
Para consultar o índice dos hexagramas, clique:
Próximo hexagrama:
- 49. Ko / Revolução
Hexagrama anterior:
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Créditos e referências
Ilustrações e fotos creditadas na ordem em que aparecem no post.- Imagem do hexagrama - diretamente do livro I Ching, o Livro das Mutações.
- Poço em algum lugar da China refletindo o céu na água parada - foto de 洋淏, encontrada no Flickr.
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