I Ching, o Livro das Mutações - Livro Primeiro, Hexagrama 44: Kou / Vir ao Encontro
Esse texto faz parte da série a respeito do I Ching, o Livro das Mutações, que publicamos no blog quinzenalmente. A proposta é apresentar os textos sobre os 64 hexagramas publicados nos livros Primeiro e Terceiro do livro de Richard Wilhelm.
Para entender melhor o que é o I Ching, sugerimos dar uma olhada no post:
Para consultar o índice dos 64 hexagramas, basta acessar:
Cada hexagrama inclui:
- uma introdução geral, apresentando aspectos básicos do hexagrama;
- o nome do hexagrama (卦名 guàmíng), que por si só já é repleto de simbolismos;
- o texto, também chamado julgamento ou oráculo, que revela em linguagem simbólica o significado do hexagrama e possui poucas frases, tendo a ele sido adicionados comentários e interpretações ao longo dos séculos, a fim de ajudar o leitor a traduzir o ensinamento ancestral;
- a imagem ou símbolo, que apresenta uma mensagem adicional, com um modelo de conduta ou um conselho estratégico para lidar com a situação indicada pelo hexagrama; e
- os textos das linhas, em número de seis, indicam alternativas ou transformações possíveis das condições retratadas no hexagrama - lembrando que as linhas são contadas de baixo para cima, sendo a linha inferior a primeira.
E isso é basicamente tudo que você precisa saber para continuar. Boa leitura!
Livro Primeiro (o Texto), Hexagrama 44: Kou / Vir ao Encontro
Este hexagrama indica uma situação em que o princípio obscuro, após ter sido eliminado, ressurge furtiva e inesperadamente no interior, abaixo.
O princípio feminino, por sua própria iniciativa, vai ao encontro do masculino.
Esta é uma situação perigosa e desfavorável, cujas possíveis consequências devem ser compreendidas e prevenidas a tempo.
Este hexagrama está associado ao quinto mês do tradicional calendário chinês (junho-julho), pois, com o solstício de verão, o princípio obscuro gradualmente ascende outra vez.
Julgamento
VIR AO ENCONTRO. A jovem é poderosa. Não se deve desposá-la.
A ascensão de elementos inferiores é aqui representada por uma jovem insolente, que facilmente se entrega para alcançar o poder.
Isso não seria possível se o forte e luminoso não tivesse também, por sua vez, vindo a seu encontro.
As coisas vulgares aqui parecem tão inócuas e convidativas que o homem busca nelas um deleite. Parecem tão diminutas e débeis que ele julga poder se distrair com elas impunemente.
O inferior ascende apenas porque o homem superior o considera inofensivo e lhe concede poder. Caso lhe fosse oferecida resistência desde o início, nunca chegaria a ter influência.
Mas a época de VIR AO ENCONTRO tem também um outro significado que deve ser considerado. Ainda que, em geral, o fraco não deva vir ao encontro do forte, em certas ocasiões isso pode ser de grande importância.
Quando céu e terra vêm ao encontro um do outro, todas as criaturas prosperam. Quando o príncipe e seu ajudante chegam a um mútuo encontro, o mundo alcança a ordem.
Aqueles que são predestinados à união, entre os quais há um mútuo depender, devem vir um ao encontro do outro. Mas, nesse movimento de VIR AO ENCONTRO, se deve estar livre de intenções não reveladas, desonestas, pois, do contrário, isso causaria malefícios.
Imagem
O vento embaixo do céu: a imagem de VIR AO ENCONTRO. Assim age o príncipe ao difundir suas ordens, proclamando-as aos quatro ventos.
A situação aqui é semelhante à do hexagrama 20, CONTEMPLAÇÃO, em que o vento sopra sobre a terra, enquanto aqui sopra embaixo do céu. Em ambos os casos, ele alcança todas as direções.
Lá, o vento estava embaixo, sobre a terra, simbolizando o governante tomando consciência das condições vigentes em seu reino. Aqui, o vento sopra de cima, simbolizando a influência exercida pelo dirigente através de suas ordens.
O céu está afastado das coisas da terra, porém as movimenta através do vento. O governante está afastado do povo, porém o movimenta através de suas ordens e decretos.
Textos das linhas
Seis na primeira posição significa: é necessário deter com um freio de bronze. A perseverança traz boa fortuna. Caso se deixe seguir seu curso, sofrer-se-á infortúnio. Mesmo o porco magro pode mais tarde vir a causar estragos.
Quando um elemento inferior surge numa intromissão indevida, é necessário contê-lo de imediato e com energia. Barrando-o com firmeza, evitam-se efeitos prejudiciais no futuro.
Caso se deixe seguir seu curso, sem dúvida o resultado será o infortúnio. A insignificância do que se intromete não é razão para subestimá-lo.
Enquanto um porco é ainda pequeno e magro, não pode causar grandes estragos, mas, depois que ele se alimentar e se fortalecer, sua verdadeira natureza se revelará, a menos que já tenha sido contida.
Nove na segunda posição significa: há um peixe no tanque. Nenhuma culpa. Não é favorável aos hóspedes.
O elemento inferior não sofre violência, porém é mantido sob suave controle. Nesse caso, nenhum mal há que se deva temer.
Mas é preciso ter cuidado para que não entre em contato com estranhos porque, uma vez solto, daria vazão incontrolável às suas tendências destrutivas.
Nove na terceira posição significa: não há pele em suas coxas e torna-se difícil caminhar. Caso se permaneça atento ao perigo, não se cometerá grandes erros.
Alguém está tentando se envolver com os maus elementos que se oferecem. Esta é uma situação muito perigosa.
Felizmente, as circunstâncias o impedem. Ele gostaria de fazê-lo, mas não pode.
Isso gera uma dolorosa indecisão no comportamento. Mas, caso ele consiga ver com clareza os perigos que a situação encerra, poderá pelo menos evitar maiores erros.
Nove na quarta posição significa: não há peixe no tanque. Isso leva ao infortúnio.
Pessoas insignificantes devem ser toleradas, de modo a que permaneçam bem dispostas para conosco. Assim, poderemos contar com elas quando o necessitarmos.
Caso nos afastemos e recusemos fazer concessões, nos voltarão as costas e não estarão disponíveis quando delas necessitarmos. Mas isso ocorreria por nossa própria culpa.
Nove na quinta posição significa: um melão coberto com folhas de chorão: linhas escondidas. Então, algo lhe cai do céu.
O melão, assim como o peixe, é um símbolo do princípio obscuro. É doce, mas estraga com facilidade; por isso, em geral protegem-no cobrindo com folhas de chorão.
Isso indica a situação de um homem elevado e forte, seguro de si, que protege com tolerância os subalternos que estão sob sua responsabilidade.
Ele possui em seu interior as linhas firmes da ordem e da beleza, mas não as ostenta.
Ele não molesta seus subordinados com ostentações ou advertências cansativas. Ao contrário, os deixa em completa liberdade, confiando firmemente no poder transformador de uma personalidade forte e íntegra.
E, atentem!, o destino é favorável. Os homens inferiores respondem à sua influência e caem em suas mãos como frutos maduros.
Nove na sexta posição significa: ele vai ao encontro arremetendo com os chifres. Humilhação. Nenhuma culpa.
Para um homem que se retirou do mundo, o tumulto da vida social muitas vezes se torna insuportável.
Há pessoas que, num digno sentimento de amor-próprio, se mantêm afastadas de tudo o que é baixo, rechaçando-o bruscamente sempre que o encontram.
Essas pessoas são criticadas como orgulhosas e inacessíveis, mas, como não estão mais presas ao dever de agir no mundo, isso não tem grande importância.
Sabem tolerar com tranquilidade a antipatia das massas.
Depois de tudo
E aqui alcançamos o final do texto sobre o hexagrama Kou / Vir ao Encontro, da primeira parte do livro I Ching, o Livro das Mutações.Caso tenha interesse, pode adquirir o livro clicando na imagem a seguir:
Para consultar o índice dos hexagramas, clique:
Próximo hexagrama:
- 45. Ts'ui / Reunião
Hexagrama anterior:
- 43. Kuai / Irromper
---
Créditos e referências
Ilustrações e fotos creditadas na ordem em que aparecem no post.- Imagem do hexagrama - diretamente do livro I Ching, o Livro das Mutações.
- Grafite de um porco usando máscara anti-gás - foto de Guilherme Tavares, encontrada no Flickr.
Nenhum comentário: