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Estátua de Confúcio na cidade de Nanquim, China

Passado o Dia Internacional da Mulher, que nos rendeu um post bem bacana sobre as mulheres na história da China, voltemos com a saga confuciana em quatro partes.

Os dois primeiros posts foram:

  1. Confúcio, o primeiro come-quieto da história
  2. Confúcio, o justiceiro e os suspeitos

No primeiro, fizemos uma apresentação de Confúcio e falamos do início de sua vida e educação.

Lá também estão os diversos links espalhados pela internet, com muita informação a respeito do sábio e que serviram de fonte para toda a saga.

No segundo, discorremos sobre sua faceta estrategista, suas peregrinações e seus discípulos. É quando nos aproximamos do final de sua vida, que veremos mesmo no próximo post.

Neste, vamos nos aprofundar um pouco na obra atribuída a ele e em seu pensamento.

Vem comigo!

Os Analetos e o pensamento de Confúcio (ou confucionismo)

Antes de prosseguirmos, vale a pena relembrar os 5 clássicos da literatura chinesa que teriam sido escritos por Confúcio. São eles

Como a chance desses clássicos aí terem sido de fato escritos ou mesmo compilados por Confúcio é praticamente a mesma de Jesus ter escrito o Pentateuco, precisamos olhar para outro lugar a fim de vislumbrar sua visão de mundo.

Ok, ok, os Analetos também não foram escritos por ele, mas eu diria que estão para o sábio chinês mais ou menos como o Novo Testamento, seguindo com a analogia, está para Jesus.

Inclusive no sentido de conter certas (ou aparentes) contradições.

E não poderia ter sido diferente, já que o texto é resultado de uma compilação de versões diferentes de seus ensinamentos, feitas por seus discípulos e por discípulos desses.

Falando em textos dos discípulos, existem pelo menos outras três obras relacionadas à doutrina confuciana (se não ao próprio):


Apanhado geral da filosofia confuciana

Antes de entrar nos detalhes e meandros da filosofia confuciana, vale fazer um resumo geral, com textos pinçados aí pelos cantos mais badalados da internet. Começamos pela digníssima Wikipedia:

A filosofia de Confúcio sublinhava uma moralidade pessoal e governamental, também os procedimentos correctos nas relações sociais, a justiça e a sinceridade. (...) Os princípios de Confúcio tinham uma base nas tradições e crenças chinesas comuns. Favoreciam uma lealdade familiar forte, veneração dos ancestrais, respeito para com os idosos pelas suas crianças (e, de acordo com intérpretes posteriores, das esposas para como os maridos), e a família como a base para um governo ideal. Expressou o conhecido princípio, "não faças aos outros o que não queres que façam a ti", uma das versões mais antigas da ética da reciprocidade.
O site da Editora LP&M também tem um textinho sobre a filosofia confuciana. Segundo ele, Confúcio

pregava uma filosofia moral que tinha o homem como peça central. Para ter responsabilidade moral, ele acreditava, um homem deve pensar por si próprio. Essa crença fez com que Confúcio desse tanta importância ao pensamento quanto ao aprendizado. O conceito central da sua filosofia era o chün tzu, um homem cujo caráter contém a virtude da benevolência e cujos atos estão de acordo com os ritos e a retidão. Para Confúcio, assim como para toda a tradição chinesa, a política é apenas uma extensão da moral: contanto que o governante seja benevolente, o governo trabalhará naturalmente pelo bem do povo.

Por fim, o site A História tem uma pequena biografia de Confúcio que nos informa:

Embora influenciado por Lao Tzu e pelo Taoísmo, K’ung Fu-Tzu decidiu seguir um caminho alternativo. A sua filosofia não está tão preocupada com a vida após a morte, como os hinduístas ou taoístas, por exemplo, e sim mais voltada às relações harmoniosas entre as pessoas, os membros da família ou mesmo na sociedade. (...) Os princípios do Confucionismo incluem, entre outros, o respeito em relação à família e à sociedade, a fidelidade aos dirigentes e deferência aos superiores, a justiça moral e social e virtude suprema de altruísmo e benevolência.

Só para lembrar, o K’ung Fu-Tzu aí de cima é o próprio Confúcio, ok? Voltando à nossa fonte básica, a Stanford Encyclopedia of Philosophy, tratemos de entender melhor isso tudo aí em cima.

Os planos dos Céus... e os primórdios do marketing pessoal?


O Coringa genial de Heath Ledger fazendo seu comercial

Pra começo de conversa, Confúcio acreditava que as pessoas vivem suas vidas com base em parâmetros firmemente estabelecidos pelos Céus, que frequentemente para ele significa tanto um Ser Supremo dotado de propósito, quanto a natureza com seus ciclos e padrões.

Por outro lado, costumava também argumentar que as pessoas são responsáveis por suas ações e, especialmente, pelo modo como tratam outras pessoas.

Nesse contexto, haveria muito pouco ou mesmo nada que se pudesse fazer para alterar o período de existência que nos é fadado (óbvio), mas é possível se determinar as próprias conquistas, bem como as razões pelas quais se será lembrado.

E, nada-nada, isso tem cheiro de marketing pessoal pra mim - há 2,5 mil anos!!!

Confúcio, o plagiador

Como já sabemos, o próprio Confúcio assumia ser um "plagiador", com seus pensamento e ações refletindo sua confiança nos antepassados, bem como seu amor por eles.

Mesmo assim, é provável que nem todo o conteúdo dos Analetos, por exemplo, seja mera repetição de ideias antigas.

Muito do que ele ensinou parecia não apenas ser original para ele, como também representava uma quebra de paradigma radical em relação às ideias e práticas de seu tempo.

Isso, a despeito do fato de ele me parecer um tanto quanto conservador. Confúcio também afirmava que usufruía de uma relação especial e privilegiada com os Céus (ai, Jesus!).
Pior, ou consequência, disse que aos 50 tons de cinza anos finalmente entendeu os planos dos Céus para si e para a humanidade.

É mole ou o cara era mesmo/se achava o cara da China?

De qualquer maneira, além dessa relação especial com forças superiores, ou até por conta disso, Confúcio reverenciava e respeitava os espíritos.

Pensava que eles deveriam ser adorados com a máxima sinceridade e que servi-los era um negócio muito mais difícil e complicado que servir a meros mortais.

Ren e a regra de ouro

A filosofia social de Confúcio gira fortemente em torno do conceito de "ren", que seria algo como "compaixão" ou "amor pelos outros".

Naturalmente, cultivar ou praticar tal interesse pelos outros envolveria um certo nível de abnegação.

Aí, aquela ideia do marketing pessoal que eu vislumbrei uns seis parágrafos acima parece ruir. É que essa abnegação teria a ver, de acordo com a visão confuciana do mundo, com agir de tal maneira a

evitar discursos astutos ou modos insinuantes que viessem a criar uma falsa impressão e levar ao auto-engrandecimento.

Muito pelo contrário, as pessoas que cultivam o "ren" possuem a característica da simplicidade e da fala mansa (talvez por isso os chineses vivam rindo à toa).

Em primeira e última instância, esse interesse pelos outros é demonstrado pelos diversos modos de se praticar a famosa regra de ouro:
Não faça aos outros aquilo que você não deseja para si mesmo.

Tem até uma variação dela, inclusive, que é bem mais legal, embora menos elegante:

Se você deseja levantar-se, então ajude os outros a se levantarem; se você deseja sucesso, então ajude os outros a obtê-lo.

Confúcio também considera a devoção aos parentes e irmãos mais velhos a maneira mais básica de promover os interesses de outros antes do próprio.

Mais do que isso até: no cerne de todo ensinamento dos Analetos relativo a ética está a noção de que a família é a arena social na qual são forjadas e empregadas as ferramentas úteis para a criação e manutenção de relações harmoniosas.

Li e a etiqueta na China antiga

Confúcio ensinava que a prática do altruísmo que ele pensava ser necessário para a coesão social somente poderia ser dominada por aqueles que aprendessem a auto-disciplina.

Aprender a auto-contenção envolve estudar e dominar o "li": as formas rituais e regras de decoro através das quais uma pessoa expressa o respeito aos superiores e encena seu papel na sociedade, de tal forma que ela própria seja digna de respeito e admiração.

Uma preocupação com o decoro deve estar presente em tudo o que se diz e faz.

Entretanto, submeter-se aos rituais não significa suprimir os próprios desejos, mas aprender como reconciliar esses desejos com as necessidades da família e da comunidade.
A ênfase de Confúcio no ritual não significa, no entanto, que ele fosse um meticuloso e dogmático cerimonialista.

Também não significava que os ritos de adoração e de intercâmbio social tinham que ser praticados corretamente a qualquer custo.

Pelo contrário, ele ensinava que os gestos cerimoniais nada significariam, caso não se possuísse um aguçado senso do bem-estar e do interesse das outras pessoas.

Igualmente importante era sua insistência para que os ritos não fossem considerados meras formas, e sim que eles fossem praticados com devoção e sinceridade completos.

Tá aí um trecho do Analetos, a respeito do próprio Confúcio, que não me deixa mentir sozinho:

Ele sacrificava aos mortos como se eles estivessem presentes. Ele sacrificava aos espíritos como se os espíritos estivessem presentes.

Espírito de devoção

E é com esse espírito de devoção que vamos encerrando o post de hoje. Mas não pense que já falamos tudo que tínhamos pra dizer sobre o pensamento confuciano e o próprio Confúcio.

No próximo e último post da série, tentaremos entender a filosofia política do mestre, bem como sua visão sobre educação e questões a respeito da virtude.

E daremos o arremate com uma breve consideração sobre o seu legado. É daqui a quinze dias e você não perde por esperar.

Enquanto isso, deixe seu comentário a respeito do que viu até agora. Prometo que vou curtir muito.

Zài Jiàn!

Créditos e referências

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