Pingzi, o Jim Carrey de Lu
Ni hao, gente fina.
Caso você ainda não saiba, estou na labuta para escrever e publicar um livro de ficção sobre Sun Tzu, autor do milenar tratado de estratégia militar conhecido como A Arte da Guerra.
Neste mês consegui avançar bastante e estou no caminho para terminar o primeiro rascunho muito em breve.
Enquanto isso, vamos continuando com os posts sobre a poesia chinesa e sobre as personagens que farão parte do livro.
Sobre as personagens, os últimos textos focaram-se em Zhao, o duque de Lu e nos eventos que resultaram em sua fuga para Qi.
Agora, vamos conhecer outra figura central desses eventos, um sujeito chamado Jisun Yiru, também conhecido como Ji Pingzi.
Antes de começarmos com Pingzi, no entanto, vamos a alguma informação sobre a província de Lu.
Quem foram seus governantes você já deve ter visto (se não, dá lá uma espiada). Que é a terra natal de Confúcio, acho que você já sabe também, não sabe?
Pois bem, o que talvez você não saiba é que já há algum tempo os duques de lá eram mais fracos que caldo de bola de gude.
Quero dizer, eles tinham o direito ao poder, mas outras pessoas é que o exerciam de fato.
Uma breve história do tempo de Lu
Antes de chegarmos a esses finalmentes, entretanto, convém recuperamos um pouquinho da história de Lu, que tal?Pois bem, Lu foi uma das muitas províncias criadas no leste da China logo no início da dinastia Zhou. Por meio dela, o poder dos Zhou alcançava uma distância considerável de sua capital, Zongzhou.
Ao longo do período conhecido como Zhou do Oeste, ela exerceu a importante missão de estabelecer o controle dos Zhou sobre a região da moderna Shandong.
Deu tão certo que no início do Período da Primavera e Outono se tornara uma das províncias mais poderosas e rival de, adivinha, Qi.
Tanto foi assim que, sob os treinados dos duques Yin e Huan, Lu chegou a derrotar Qi e Song em diversas ocasiões (além de outras províncias menores, naturalmente).
Mas como é implacável a lei da gravidade, Lu começou a declinar a partir de meados do Período, ao mesmo tempo que sua rival se fortalecia.
À medida em que a província definhava, seus duques iam também perdendo poder para os chamados Três Huans: os Jisun (de Pingzi), os Mengsun e os Shusun.
Esses clãs eram assim chamados porque descendiam do acima mencionado duque Huan.
Sua dominação era tamanha que eles estiveram diretamente envolvidos nos eventos que levaram Zhao ao exílio em, ironia das ironias?, Qi.
E dito isso, voltemos à história de Pingzi, que é o que temos pra hoje.
Pra "trasmente"
Segundo o site China Knowledge, Pingzi tem pelo menos três ascendentes de peso en Lu. São eles Ji You, Ji Wenzi e Ji Wuzi.You era seu tataravô e foi quem deu início à linhagem dos Jisun.
Ele era um dos filhos do venerado duque Huan e também irmão do duque Zhuang, tendo se tornado, ainda, conselheiro do duque Xi, que governou Lu entre 660 e 627 AEC.
Wenzi (Jisun Xingfu) era seu bisavô e também o cara que administrava Lu quando o duque Cheng estava no poder. Tinha a fama de possuir uma elevada moral e um comportamento incorruptível.
Por fim, como você já deve ter deduzido, Ji Wuzi (Jisun Su) era seu avô e também foi alto ministro em Lu.
Após criar os três exércitos em 562, Wuzi foi convencido a dividir poderes e responsabilidades com as outras duas poderosas famílias da província.
Ele também foi responsável por organizar a cerimônia do boné viril para o duque Xiang, o antecessor de Zhao.
Aliás, foi Wuzi quem bancou a ascensão de Zhao, que era filho de uma concubina e não deveria ter se tornado soberano de Lu.
Seu pai aparentemente chamava-se Jisun Daozi, mas não consegui encontrar mais informações sobre ele em minhas fontes.
Também não há informações sobre o nascimento de Pingzi, e a primeira vez em que ele é citado nos Anais tem a ver com a construção de um parque - momento em que, provavelmente, ele já era chefe do clã Jisun.
O apressadinho
Ele queria que o parque de Lang fosse rapidamente finalizado, mas Shusun Zhaozi o aconselhou a não ser assim tão apressadinho.Além de fazer referência uma ode do Livro das Canções, Zhaozi falou algo de tipo:
Por que tem que ser rapidamente concluído? Isso tenderia a destruir o povo. Podemos passar sem um parque; mas podemos passar sem o povo?
Isso foi em 532 AEC, três anos depois da morte de seu avô, e não se sabe se ele seguiu o conselho.
No ano seguinte, junto com Shu Gong e Zhongsun Jue, Pingzi liderou o exército de Lu em um ataque a Ju.
Após tomarem a cidade de Geng, ao apresentar os prisioneiros, ele sacrifica uma vítima humana no altar de Bo.
Isso gerou críticas em Qi (e provável que em outros cantos), já que sacrifícios desse tipo não eram bem vistos.
Um cabra chamado Zang Wuzhong, de Qi, inclusive, ao fazer referência a outra ode, afirmou que Zhou não aceitaria o sacrifício de Lu, pois nele não havia retidão e
O desrespeito pelas pessoas neste caso deve ser tratado como excessivo. Assim, usando os homens como vítimas, quem irá abençoar Lu?
Já em 530 AEC, ele participa de uma reunião em Jueyin para tratar do futuro da província de Cai, ameaçada pela poderosa Chu. No entanto, nada é registrado sobre sua atuação.
Desavenças e ameaças
No outono do ano seguinte, Pingzi começa a se desentender com algumas pessoas. A primeira delas é Nan Kuai, um dos filhos de um sujeito chamado Nan Yi.Ao ser tratado com descortesia por nosso amigo, Kuai foi ter com um dos filhos do falecido duque Xiang, o Gongzi Yin (ou simplesmente Zizhong). E desabafou em tom de ameaça:
Eu vou expulsar o chefe da família Ji e dar suas posses ao duque. Você vai tomar o lugar dele e eu vou manter Bi como vassala do duque.
Bi era uma cidade que pertencia à familia de Pingzi (os Jisun), mas era administrada por Nan Yi, pai de Nan Kuai, que partiu para explicar a Shuzhong Muzi o que ia fazer e também seus motivos.
Muzi tratou então de provocar uma desavença entre Pingzi e Shusun Zhaozi.
Aproveitou-se, para isso, da fato de Zhaozi ter obtido pela terceira vez uma espécie de nomeação, o que lhe colocava num nível superior ao de Pingzi.
Shuzhong teria dito algo mais ou menos assim a Pingzi:
Com suas três nomeações ele ultrapassou o ranking do próprio pai e também o seu. Sendo você um primo mais velho, isso é contrário ao decoro.
Nosso amigo concordou e enviou alguém a Zhaozi para solicitar que ele declinasse a nomeação. Sua resposta foi algo do tipo:
A Casa de Shusun teve seus infortúnios de família quando os filhos da esposa oficial foram mortos e o filho de uma concubina foi nomeado em seu lugar. Por isso alcancei a posição que ocupo hoje. Se você tivesse aproveitado esses infortúnios para me arruinar, eu teria aceitado seus comandos. Mas agora, se a nomeação de nosso soberano não for anulada, eu certamente tenho esse nível e posição.
O espírito de Houdini
Shusun Zhaozi foi então à corte e ordenou aos oficiais, após informar que teria um litígio com Pingzi, que eles escrevessem os pleitos com imparcialidade. Ahã... sei...Pingzi teve receio e tentou jogar a culpa em Shuzhong Muzi - que na verdade foi quem começou a coisa toda, lembra?
De qualquer maneira não funcionou, pois outro Shuzhong, o Xiao, juntou-se a Nan kuai e Gongzi Yin (o filho do falecido e defunto duque Xiang), a fim de tramar contra Pingzi.
Yin então informou o duque Zhao sobre o problema e, na sequência, partiu com ele para Jin. Nan Kuai, temendo que seus planos falhassem, provocou uma revolta em Bi e passou a servir a Qi.
Ao retornar de Jin e tomar conhecimento da confusão, Yin viu que tinha metido as mãos pelos pés e partiu em fuga para Qi.
De alguma forma, apesar de três forças atuarem contra si, Pingzi conseguiu se safar.
Inclusive, quis fazer com que Shusun Zhaozi expulsasse Shuzhong Xiao. Mas parece que Shusun tendia mais para a conciliação que para a discórdia e deixou tudo como estava.
Na primavera de 528 AEC, Pingzi tenta retomar Bi utilizando-se dos préstimos de Shu Gong. A tentativa falha, Gong é derrotado e nosso chegado fica furioso.
Ordena então que qualquer homem de Bi (provavelmente que estivesse na capital) fosse capturado e mantido prisioneiro. Dessa vez é Ye Qufu quem o adverte:
Essa é uma decisão equivocada. Se um homem de Bi for visto sentindo frio, o agasalhe, se for visto passando fome, o alimente, provando que você é um bom senhor e ajuda com as privações e problemas deles, que virão a ti como se viessem para casa. Assim, os Nan perecerão, as pessoas se revoltarão e não haverá quem habite na cidade com eles. Se você os afligir com sua severidade e os amedrontar com sua ira, de tal maneira que eles passem a detestá-lo e se mantenham revoltosos, você estará tão somente ajudando Nan a obter novos seguidores. Se todas as províncias assim procedessem com eles, os homens de Bi não teriam a quem recorrer. E se eles não aderissem ao chefe dos Nan, aonde poderiam ir?
Dessa vez, Pingzi segue o conselho, que se mostra acertado. Mas, como diz um primo meu, a vida não é fácil.
Um pouco adiante, enquanto várias províncias estão reunidas para tratar da "política externa", Jin captura Pingzi e o mantém prisioneiro.
Algum tempo depois, eles percebem que não teriam vantagem alguma em manter o prisioneiro e mandam um sujeito chamado Shuyu libertá-lo.
Pelo que entendi, entretanto, o cara informa ao prisioneiro que estão armando pra cima dele. Pingzi, com medo, dá um jeito de retornar para Lu antes de Zifu Jiao (Huibo), um conterrâneo seu que o estava a servir no exílio.
Fica parecendo até que o cara não tinha lá muito apreço pelas pessoas que o ajudavam, não é mesmo?
Mas isso obviamente não importa agora, já que estamos finalizando o post e deixaremos o resto da história de Pingzi para um futuro breve, brevíssimo.
Enquanto isso, continue nos acompanhando, compartilhe se você curtiu e deixe sua opinião nos comentários.
Zài Jiàn!
Créditos e referências
- As informações acima são baseadas em três fontes:
- no texto comentado dos Anais da Primavera e Outono, referente ao à regência do duque Zhao (da província de Lu) disponível no site do Instituto para Tecnologias Avançadas em Humanidades (IATH), da Universidade de Virgínia.
- Na página a respeito de Lu no site China Knowledge.
- O artigo sobre Lu disponível na Wikipédia (em inglês).
- A imagem do todo poderoso Jim Carrey foi obtida no blog Lição de Vida.
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