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A grande intica e erros que não se comete n'A Arte da Guerra

Quem à língua não põe freio, depois não deve estranhar a desgraça que lhe veio, porque se pôs a falar.
Trova popular espanhola, via Peregrina Cultural


Poucos posts atrás, destaquei dois trechos dos Anais das Primaveras e Outonos que contribuíam para iluminar a personalidade de Nang Wa, o ganancioso ministro-chefe da província de Ch'u - uma das muitas que formavam a China da época de Sun Tzu, autor do tratado militar A Arte da Guerra.

Hoje vamos conhecer mais um dos episódios dos Anais que ajudam a entender melhor quem era esta figura, digamos assim, peculiar.

Trata-se de uma passagem do texto clássico que, me parece, ilustra o quanto este rapaz era suscetível a fofocas e o quanto ele era chegado a intrigas da corte.

A encrenca tem a ver com um oficial de baixo escalão de nome Xi Yuan e seus desafetos Fei Wuji e Yan Jiangshi, membros do alto escalão da província.

Diz o texto que, por volta de 514 AEC (mais ou menos na mesma época em que Liao estava se dando mal em Wu), o

... oficial Xi Yuan era um homem reto e sossegado, mas ele era odiado por Fei Wuji e por Yan Jiangshi, comandante da Esquerda, que era um partidário de Wuji. O ministro-chefe, Zichang [Nang Wa], gostava de presentes e emprestou uma orelha à calúnia. Assim, Wuji, a fim de caluniar Xi Yuan, disse a Zichang:

'Zi'e (designação do Yuan) pretende convidá-lo para beber com ele'; e então ele disse para Zi'e que o ministro-chefe quis vir e beber com ele em sua casa. Esse oficial disse:

'Eu sou de baixo escalão e indigno de uma visita do ministro-chefe. Se ele insistir em me fazer uma visita, a bondade é extrema; com o que devo recompensar-lhe?' Wuji respondeu:

'O ministro-chefe gosta de gibões e de armas afiadas. Traga-me o que você tem destas coisas e eu vou fazer uma seleção deles.'

Ele então tomou cinco de cada um e disse: 'Coloque estes ao seu portão. Quando ele vier, certamente os verá e você pode em seguida presentear-lhe.'

O pato e a conversa fiada

Xi Yuan, tanto quanto Nang Wa, caiu como um pato na conversa fiada de Wuji e, no dia da visita, ergueu uma tenda com os presentes do lado esquerdo do seu portão. Wuji então disse ao ministro:

'Eu quase trouxe desgraça a você. Zi'e tem más intenções para contigo e tem homens armados em seu portão. Você não deve ir. Além disso, na recente expedição, deveríamos ter conseguido impor nossa vontade sobre Wu, mas Zi'e recebeu subornos e retornou. Ele também se impôs aos outros comandantes, os fazendo se retirar ao dizer que seria inauspicioso tirar proveito dos distúrbios [o assassinato de Liao] em Wu. Como Wu havia tirado vantagem de nosso luto,  não teria sido apropriado tirar proveito de sua confusão?'

O luto em questão é exatamente o morte do wang P'ing, da qual falei neste e neste outro post. Os comentários aos Anais dão conta, então, das ações de Nang Wa após a "revelação" de Wuji:

O ministro enviou um mensageiro para a casa de Xi, onde foi encontrado o gibão. Assim, ele não foi para o festim, mas mandou chamar a Yan Jiangshi, informando-lhe sobre as circunstâncias. Quando Jiangshi retirou-se, ele deu ordens para atacar e queimar a casa de Xi. Quando Zi'e ficou sabendo, matou-se. Ao mesmo tempo, as pessoas não queimavam a casa e uma ordem foi emitida para que todos os que não cooperassem fossem considerados tão culpados quanto Xi. Então, alguns pegaram uma corda [rush rope] e um punhado de palha, mas ainda assim desistiram de queimar a casa.

O ministro-chefe então fez valer sua vontade e extinguiu todos os ramos da família Xi e seus partidários, sentenciando à morte Yang Lingzhong e seus irmãos mais novos Wan e Tuo, além de Jin Chen, com seus filhos e irmãos mais novos. Os parentes de Jin Chen gritaram na cidade: 'Yan e Fei estão fazendo-se reis e por sua própria autoridade provocando calamidade à província de Ch'u, enfraquecendo e desgastando a casa real, e enganando o rei e o ministro-chefe para seu próprio ganho. O ministro-chefe acredita neles inteiramente; o que será do Estado?' Isso afligiu o ministro-chefe.
Como se vê, Nang Wa vendeu-se a uma mentira porcamente elaborada sem nem ao menos, aparentemente, verificar a veracidade das informações de Wuji - pelo menos é o que dá pra perceber ao ler este trecho dos Anais.

Além disso, a ação desastrada de Nang Wa (mais uma... hehe) deixa de fora da carnificina o filho de Xi Yuan, Po P'i, a respeito do qual você também já leu aqui mesmo no blog.

Po P'i de alguma forma conseguiu escapar e, adivinha só, foi parar em Wu, a província arquirrival de Ch'u, tornando-se um dos principais oficiais de Ho-lü (ou Kuang, o mesmo do episódio do indigesto peixe assado), ao lado de Wu Tzu-hsü e Sun Tzu.

Mas chega de intrigas por hoje e, acho, chega de falar de Nang Wa. Agora, só no livro, assim acredito.

Inté!


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PS
Além dos Anais com comentários, consultei o livro de Sima Qian, historiador do final do século II AEC, para trazer a conclusão com a fuga de Po P'i. Divirta-se, comente, compartilhe e volte sempre!
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Cartum genial do artista Bruno Ortiz.

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